Crônica: Reconstrói a minha Igreja

Crônica: Reconstrói a minha Igreja

À sombra da torre silenciosa do Mosteiro de São Bento e sob a cúpula ferida da Catedral Basílica de Nossa Senhora das Neves, há algo que estremece além das pedras e das cimalhas: é a própria estrutura desta Igreja que ameaça ruir, não apenas em suas paredes centenárias, mas em suas relações, em sua acolhida, em sua missão.

Os noticiários trouxeram, nos últimos dias, imagens duras e tristes de parte do muro do mosteiro desabando e da cimalha da catedral cedendo. Graças a Deus, sem vítimas. Mas mesmo na ausência de corpos feridos, há algo que se machuca profundamente: o coração da Igreja que pulsa enfraquecido onde deveria ser mais forte — na vida do povo de Deus, que busca refúgio, acolhimento, e encontra, por vezes, portas cerradas e olhares duros.

Esses eventos nos remetem, de maneira quase mística, àquela cena que mudou a vida de Francisco de Assis: o jovem que, diante da cruz de São Damião, ouviu de Cristo o pedido que ecoa ainda hoje — “Francisco, vai e reconstrói a minha Igreja, que, como vês, está em ruínas”. Na ocasião, o jovem santo compreendeu primeiro o chamado ao pé da letra, restaurando igrejinhas de pedra e barro; só depois entendeu que a verdadeira reconstrução era espiritual, era moral, era humana.

Hoje, nossa Arquidiocese da Paraíba parece ouvir esse mesmo clamor — não apenas por restauro arquitetônico, mas por conversão pastoral. O Cristo da cruz de São Damião fala também ao coração dos nossos tempos, em meio a vistorias técnicas e laudos de engenheiros: “Minha Igreja está em ruínas”.

E o que seriam essas ruínas senão os gestos ásperos de quem deveria acolher, os silêncios frios onde deveria ecoar o consolo? Não são poucos os relatos de vários paroquianos que, ao buscarem ajuda, consolo ou até mesmo sacramentos, encontram portas fechadas — não as de madeira, mas as do coração de quem deveria ser reflexo da misericórdia divina de Cristo. Padres que se distanciam, que impõem fardos e, assim como os Fariseus criticado por Jesus, não caminham junto com o povo. Que tratam a pastoral como burocracia e não como missão. E assim, pedra sobre pedra, os muros da fé vão rachando.

É preciso deixar claro que essa abordagem não se refere a todos, nem pretende generalizar. Há muitos bons pastores, generosos, piedosos, incansáveis no cuidado com seu aprisco e com suas ovelhas. Porém, num universo cristão cuja essência é a salvação das almas — todas elas — não deveria haver exceção.

“A negligência pastoral não pode ser apenas uma questão de personalidade ou estilo, porque o Evangelho não permite neutralidade no amor.”

De fato, a comunidade em nossa Arquidiocese sempre esteve ao lado da Igreja, mesmo nos momentos mais difíceis, como nos escândalos que abalaram a credibilidade da instituição. Foi o povo quem sustentou os templos com suas orações, sua presença e até seus recursos, mesmo quando a hierarquia falhava. Mas, ultimamente, o que se percebe é que algumas dessas ovelhas — já feridas — são obrigadas a abandonar o “redil”, não por falta de fé, mas pela falta de acolhida e piedade por parte de quem também prometeu apascentar as ovelhas de Cristo. Não é Deus quem as expulsa. São os gestos frios de alguns dos que deveriam representar Seu amor, um amor manso e humilde.

Talvez seja tempo de contemplarmos a Catedral não apenas como estrutura que ruiu, mas como símbolo de um chamado divino. A queda da cimalha do coro pode ser um grito: reconstruam! Reconstruam com mãos mais ternas Minha Igreja, com escuta mais atenta, com acolhimento mais evangélico. Que os muros que se erguem dentro das sacristias sejam derrubados, e em seu lugar nasçam pontes.

Assim como São Francisco entendeu, que compreendamos também: não basta rebocar paredes se o que sustenta a Igreja — a fé, o amor, a comunhão — está cedendo.

A Igreja não cairá por força das chuvas, mas pode se corromper pela dureza de corações. Que o Cristo da cruz, o mesmo que falou ao jovem de Assis, fale hoje a cada sacerdote, a cada agente pastoral, a cada batizado: “Vai. Reconstrói a minha Igreja.”

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Ivaldo Lima

Graduado em Sistema para Internet e Comunicação Social, Radialista com especialização em Marketing Digital!
Graduando em Teologia Católica.
Pós-Graduação em Doutrina Social da Igreja e Ordem Social!